segunda-feira, agosto 17, 2009

Espiral

A balança não terá essa capacidade de medição, mas eu sei bem que estou mais pesada. Carrego às costas as culpas que são minhas e as que não são, carrego angústias, medos, ansiedades, revoltas. Se tivesse a força das convicções talvez a carga fosse menos pesada, ou talvez não. Não tenho certezas disso tal como não tenho certezas de quase nada por estes dias.

Dou comigo que nem peixe no aquário, dotado de apenas um neurónio. De cada vez que completo uma volta vejo sempre a mesma porta e no entanto, surpreendo-me como se a visse pela primeira vez. E então dói como se fosse a primeira vez, e tenho que me explicar tudo de novo, desde o início, para que eu própria volte a entender porque é que tivemos que chegar a este ponto deles irem para ali. Entretanto inicia-se mais uma volta e pela altura em que chego ao fim e me vejo de frente para a porta, torna a doer. Então explico tudo de novo a mim própria, enquanto recomeço mais outra volta.

Aquilo tem uns corredores muito compridos onde ela persegue uma esperança qualquer de não deixar de andar tão cedo. Quando lá vou vê-los vou como num sonho, ando mas queria correr para lá chegar mais depressa, chego mas só queria sair e levá-los comigo para não voltar mais.

Aquilo tem um pomar muito lindo onde se espera que ele ocupe o corpo e o espírito. Receio que sejam demasiado altas as expectativas em torno daquela meia dúzia de árvores de fruto: espera-se que delas nasçam peras, figos e uma qualquer ilusão de liberdade, de bem-estar. Sim, é pelo melhor que ele lá está, embora por ele nem fosse preciso. Sim, é por vontade própria que ele lá está, por amor, por dever, por grandeza de espírito, maior que a minha, sem dúvida. Sim, sim, já me lembro disso tudo, tem tudo imensa lógica. Deixa-me cá dar mais uma volta no aquário.

E ao mesmo tempo há tanta coisa para fazer. Há uma imensidão de coisas para fazer tão grande, que me esmagam ao ponto de me faltar o ar. Coisas que eu não quero fazer, que não vejo onde arranjar forças para fazer, que não poderei deixar de fazer.

Não sei que presente é este e muito menos que futuro está por vir. Assim de repente, vejo ali uma porta que eu já devia reconhecer, mas que ainda preciso de voltar a explicar-me o que é que significa. E que espécie de pessoa serei eu, que a vou transpor.

Esgoto-me, para me distrair concentro-me em pormenores onomásticos: porque será que lhes chamam lares? Se calhar é pelo conforto que a palavra transmite, mas não deixa de ser um bocadinho hipócrita...