segunda-feira, setembro 25, 2006

Cidália e Julieta

Lá no escritório ninguém gosta muito da Cidália. É um bocado burra, tem um corpo meio desconchavado e nunca diz nada que interesse aos outros à sua volta. Parece uma versão feminina do Mr. Bean. Anda sempre sozinha. As pessoas riem-se à socapa daquela figura que parece sempre deslocada na sua profissão, deslocada nas roupas que veste, deslocada nas coisas que diz quando tenta ser simpática, deslocada dentro de si mesma. Solteirona e encalhada, se ainda não tem os 40 já não falta muito de certeza. Olha-se-lhe para dentro dos olhos e não se vê nada, ninguém sabe que pessoa é, nem o que é que verdadeiramente pensa, se é que pensa alguma coisa.

A Julieta é uma das pessoas que não a grama nem à lei da bala. Não perde uma oportunidade para a reduzir à sua insignificância, de preferência puxando dos seus galões de profissional superior e do seu estatuto de mulher bem casada. No outro dia o sarcasmo roçou a crueldade, quando se referiu a um hipotético namorado, coisa que não consta que exista ou alguma vez tenha existido para a Cidália. Uma boca foleira ao género toma-lá-que-já-te-entalei, especialidade exclusiva de mulher para mulher.

A outra deu-lhe uma resposta já meio entaramelada pela timidez e respeito à hierarquia, rodou nos calcanhares e sentou-se a engolir a frustração virada para o ambiente de trabalho. É uma questão de tempo até que lhe passe pelas mãos um qualquer processo de grande importância para a Julieta, e nessa altura, alguma coisa irá desaparecer ou correr mal, por motivos que ninguém entenderá.

A anos-luz das frustrações desta insignificante Cidália (será que ainda é virgem, coitada), a bem sucedida Julieta encaminha-se para casa tarde a más horas. Não há pressas. Hoje, tal como na maior parte dos dias da semana, tem à sua espera uma casa em silêncio, só terá a companhia do marido lá para as tantas da manhã. Também ele é um homem muito bem sucedido e atarefado.

domingo, setembro 24, 2006

"Mas vocês acham que eu ando aqui a dormir?..."


Estou deliciada com a campanha pró-vandalismo do mupi publicitário da Delta que surgiu recentemente, e que conta com a participação daquele rapaz que se diz que é humorista, um tal de Bruno Marques, ou assim.

É o jogo do "mata-esfola" a uma escala global, e isso é giro. Que é como quem diz, ai vão vandalizar isto de qualquer das maneiras, então vamos lá a fazer um concurso a ver quem é que vandaliza melhor.

Num País que tantas vezes prima pelo cinzentismo, acho notável que uma empresa tenha suficiente poder de visão para vender o seu produto recorrendo ao humor. E ainda por cima, tem a inteligência de continuar a aproveitar meios alternativos de publicidade, patrocinando um prémio para o autor do melhor acto de vandalismo.

Está tudo muito bem explicadinho aqui na chafarica do xô Marques. E para ver os vandalismos todos (que já me fartei de rir hoje), façam favor de clicar. Mas não resisto a deixar um dos que mais gostei, com a devida vénia ao autor, Manual de Deus.

quarta-feira, setembro 20, 2006

Parece anedota de loura mas não é

Certa rapariga foi a um restaurante chinês e apreciou o exotismo dos caracteres impressos nos pauzinhos da refeição.

Resolveu tatuar os ditos caracteres no pescoço. Ficou bem giro, deu-lhe um certo estilo e tal.

Quando chegou ao trabalho, tinha lá um colega de origem chinesa que traduziu aquilo para o pessoal.

Dizia "bom apetite".

sexta-feira, setembro 15, 2006

Literatura, palavras cruzadas e sudoku

Que o meu pai cultiva o hábito da leitura, já eu sei de há muitos anos. Palavras cruzadas, também foi sempre um passatempo preferido, tudo bem. Agora, sudoku? Ficámos de boca aberta, eu e a minha irmã. O sr. Manuel, do alto dos seus 75 anos, anda-me a fazer sudokus como se não houvesse amanhã.

"Ah e tal, os do Correio da Manhã e do Record faço com uma perna às costas. Os do 24 Horas são uma porcaria e desconfio que estão todos engatados. E os do Público são difíceis à brava, vejo-me à rasca para os fazer e muitas vezes não consigo..."

Meti a viola no saco. Sim, porque aqui esta cabeça loira que vos tecla está prontinha a varar a noite dissertando sobre questões profundas como o Existencialismo nos filósofos alemães, os dogmas e contradições da religião católica, a pintura Expressionista. Mas se me puserem daqueles quadradinhos com números à frente os meus neurónios começam a chocalhar todos uns contra os outros e o único pensamento que consigo formular é "sistem failure".

Sudoku. "Ah e tal, tenho um sistema para fazer aquilo...". E explicou como é o sistema. Não percebi patavina. Mas abençoado seja o exercício regular que ele faz ao próprio cérebro. Cheira-me que são anos ganhos de sanidade mental, e mais tempo para nós podermos desfrutar da sua companhia com boa saúde.

quinta-feira, setembro 14, 2006

Ciganices

Cigana:
Venho aqui perguntar porque é que não tenho direito ao subsídio.

Funcionária Pública:
A senhora não tem direito porque o seu IRS de 2005 tem um rendimento de 15.000 €...

Cigana:
15.000 €?!?!?! Com a vida desgraçada que eu levo?... Isso não pode ser!...
Esse IRS não é meu.
Esse IRS é meu mas o contabilista enganou-se, a culpa é dele.
Dê-me uma cópia disso, não sei do original do IRS.
Roubaram-me o original quando me assaltaram o carro, partiram-me o carro todo.

E a Funcionária Pública vê-a todos os dias a almoçar no café com as quatro filhas...

terça-feira, setembro 12, 2006

Olha! Baixou a gasolina outra vez

Mas eu hoje em dia já desconfio muito destas baixas de preço.

Cá para mim, os gajos estão só a recuar para tomarem balanço.

terça-feira, setembro 05, 2006

O meu nome é Albicans. Candida Albicans.

E tem licença para me atormentar. Ando há sete meses a lutar contra uma inflamação vaginal provocada por este fungo e estou cada vez mais desesperada. Nada resolve o problema. Já tenho que puxar muito pela cabeça para me recordar de todos os tratamentos que já fiz, de todas as substâncias que já ingeri ou apliquei, tudo o que consigo após cada tratamento são alguns dias, desta última vez então, apenas algumas horas de alívio até a inflamação voltar, sempre com mais força.

A minha esperança era que, quando me sentasse para escrever sobre este problema fosse uma coisa do género, aconteceu-me isto, resolvi desta maneira assim, assim. Um pouco até para ajudar uma desgraçada qualquer que, tal como eu, ande a circular pela internet à procura de alguma resposta que ainda ninguém deu, alguma substância activa que ainda não se experimentou, qualquer coisa, que eu por mim falo, se por esta altura me garantirem que para resolver o problema o melhor é saltar de um sítio qualquer alto, eu vou direitinha à Ponte 25 de Abril, atiro-me e nem discuto.

Mas não. Não tenho solução para apresentar. Antes agradeço qualquer contributo que surja de quem já tenha passado pelo mesmo ou saiba do que é que eu estou a falar. Porque eu já não sei o que hei-de fazer mais.

Os primeiros sintomas surgiram em finais de Janeiro. Comichão, ardor, não me espantou por aí além, eu fazia natação três vezes por semana (fazia, porque entretanto já abandonei) e as mulheres têm a chamada porta aberta para o mundo. Nestas circunstâncias, uma inflamação por Cândida é coisa corriqueira. Fui ao meu médico que me mandou aplicar o “Gyno-Pevaril” (Nitrato de Econazol). Não passou. Voltei lá, para ouvir o primeiro disparate de todo este processo. E ainda me custa mais, vindo de um médico que já me conhece há anos, e que até costuma ser tão cauteloso nos diagnósticos. Enfim. Que não havia nenhum fungo. Que o que eu tinha provavelmente era alguma ferida, provocada por uma incompatibilidade anatómica entre mim e o meu parceiro(?!). Mandou-me aplicar um outro creme, desta vez o “Travocort” (Nitrato de Isoconazol + Valerianato de Diflucortolona).

No início de Março, já a dizer mal da minha vida, virei-me para o ginecologista. Ao princípio a coisa parecia bem encaminhada. De acordo com a observação, o meu mal era Thricomonas, independentemente da existência do fungo. Lá fui eu recambiada, com comprimidos “Flagentyl” (Secnidazol) para tomar, eu e o meu parceiro, e mais 10 dias a aplicar óvulos “Flagyl”, com a mesma substância activa. Nesta altura entraram as alergias ao barulho, e já não consegui concluir o tratamento. A alergia aos óvulos foi de tal maneira que o simples facto de me limpar com papel higiénico deixava-me a amarinhar pelas paredes com comichão e ardor. Fui ter com o ginecologista de urgência que me passou para o creme “Gino-Canesten” (Clotrimazol). Melhorei. No fim deste tratamento fui fazer um exsudado vaginal pela primeira vez, e para mal dos meus pecados, cedo demais. Assim, quando me cheguei ao senhor doutor com uma análise negativa, mas a dizer-lhe que continuava a não me sentir bem, ele preferiu acreditar na análise e não em mim. Veio a segunda dose de disparates. Que eu precisava de me descontrair. Não foi por estas palavras, mas no fundo o que me foi transmitido é que o problema já não estava na vagina, mas sim na cabeça. E eu, estúpida, deixei-me convencer daquilo. Fui para casa esperar pelo resultado da citologia, tentando convencer-me que os sintomas eram todos psicológicos.

Em Abril voltei ao mesmo médico, porque me sentia cada vez pior. Fui lá perder o meu tempo e o dele. Que eu não me podia andar a lavar com anti-sépticos. Que era por isso que eu não melhorava. Areje, não se lave muito, descontraia-se, adeus e um queijo. Em Maio passei para outro ginecologista, nesta altura já totalmente deprimida. Na observação estava tudo bem, não havia motivos para. Fiquei de lhe levar o resultado da citologia, que tardava. Fui lá na semana seguinte, com mais outro resultado negativo. Palavra de honra que eu nunca imaginei receber resultados de análises que diziam estar tudo bem, e ficar desesperada a chorar agarrada aos papéis. As análises diziam uma coisa mas eu sentia outra totalmente diferente.

Acabei a repetir o esxudado por minha própria conta. E já armada em médica de mim mesma, enquanto esperava pelo resultado, comprei uma embalagem de “Sporanox” (Itraconazol), e só no primeiro dia tomei 400 mg. A seguir, 100 mg por dia, durante cinco dias. Enfim, mal não fez, mas também não resolveu.

Parei com a pílula e abandonei definitivamente a piscina (também, as vezes que lá consegui ir nos meses anteriores contaram-se pelos dedos). Em finais de Maio mudei para uma ginecologista que pelo menos tem a virtude de partilhar a minha frustração perante os insucessos. Levei-lhe uma análise positiva para Candida Albicans. Vim de lá cheia de esperança que desta vez é que era. Anti-inflamatório “Maxilaze” (Alfa-Amilase) + anti-alérgico “Xyzal” (Cloridrato de levocetirizina) durante 10 dias, seguidos de 12 dias a aplicar óvulos “Dafnegil” (Nifuratel + Nistatina). Ao mesmo tempo, uma droga nova para fazer as vezes de vacina. “Baciginal Oral”, um suplemento alimentar com probióticos, ainda pouco conhecido, e que ao fim de 12 dias me deixou cheia de urticária. Era suposto tomar aquilo 45 dias seguidos. Deixei de os tomar, terminei o resto do tratamento e tudo até levava a crer que estava resolvido, finalmente.

Tive descanso durante 10 dias. Quando fui repetir a análise já ia com a certeza do que é que me esperava. Lá voltou o resultado positivo para Candida, e a uma pesquisa por Chlamydia e por Mycoplasma, veio o resultado negativo para a primeira (alívio), mas positivo para o segundo, com um bicharoco chamado “Ureaplasma urealyticum”.

A última consulta foi em Agosto. Com a médica a dizer que já não sabe o que me há-de fazer. Tomei antibiótico “Vibramicina” (Doxicilina) para ver se mato o Mycoplasma, e tomei o “Rapamic” (Cetoconazol) durante 11 dias. A seguir reforcei com mais 12 dias de “Dafnegil”. Bastou tomar um comprimido de cada para a alergia se manifestar outra vez. Felizmente consegui controlá-la, mas só recorrendo a mais medicamento, desta feita “Atarax” (Hidroxizina). Terminei no Sábado passado, e desta vez nem tive direito a descanso. Os sintomas nunca chegaram a desaparecer totalmente, e foi uma questão de horas até se afirmarem definitivamente, a uma velocidade que eu considero ao mesmo tempo assustadora e impressionante.

Já na base do desespero vou dobrar a dose diária de “Rapamic” e engolir mais uns tantos comprimidos nos próximos dias. Anti-inflamatório “Nimed” (Nimesulida), porque não, já agora marcha também. Nesta altura já estou a rezar para não acordar amanhã de manhã cheia de manchas pelo corpo todo, mas desconfio que é o que tenho mais certo. Dizem que aplicar iogurte natural às vezes ajuda, vou experimentar isso também. E depois lá tenho eu que esperar 15 dias para repetir a análise, agora com um teste de resistência aos antifúngicos, para ver se ando a tomar alguma coisa que em vez de matar, esteja a dar de comer à bicha.

Entretanto vou virar-me também para o alergologista, porque sei lá, às tantas ando a comer alguma coisa à qual sou alérgica, e não tenho dúvidas que por esta altura o meu sistema imunitário está a precisar de uma ajuda qualquer.

O que é que falta? Qual é a análise, qual é a droga, produto químico, natural ou assim, assim, seja o que for, eu estou disposta a tudo. Haverá algum médico que saiba mais do que estes que eu tenho visitado, e tenha na manga algum tratamento eficaz para me devolver a uma vida normal? Aquela vida normal que eu passei tantos, demasiados anos sem ter, e que agora teria, não fosse isto.

O pior de tudo é pensar na possibilidade que mais me atormenta, a de que se calhar não há nada a fazer, e que a minha vida não vai passar disto. Sei que estes pensamentos negativos não me ajudam em nada. Mas a verdade é que, se há dias em que vou buscar forças não sei onde, optimismo não sei a quê, e a coisa leva-se, outros há em que já não me sinto capaz de nada. Só de me estender ali no sofá, fechar os olhos e deixar-me dormir.