"Que ninguém fale de prudência ninguém fale
de esperar. Há palavras que estão gastas (que me gastam)
Ponderação me pedem. Exigem que me cale
mas bebem do meu vinho meus campos devastam
à resignação chamam virtude juventude à indignação
com seus conselhos me enfastiam com seus prémios me castigam.
Se digo não me dizem sim se digo sim me dizem não
calar-me é doloroso mais ainda me é falar
pois o silêncio é uma traição mas há palavras que me gastam
há um falar que não é dizer há um tempo que se gasta.
Ah não me peçam para esperar que de esperar
eu desespero e a esperança já não basta
que já não posso já não posso suportar
nem os velhos que me falam da virtude
nem os novos que começam a ser velhos.
E se a revolta (dizem) é juventude
eu vos digo que há um tempo de acabar
com este tempo que se gasta e que nos gasta.
Altas são as montanhas. E as águas do mar são vastas.
Partir ou não partir. De qualquer modo ousar.
Pois o tempo é de agir. E as palavras estão gastas."
Manuel Alegre
Um Barco para Ítaca, 1971
4 comentários:
A diferença pode estar (ou não) entre o que se sente (que é bom) e como se faz (que é complexo), num País de pessoas muito medíocres.
Como ouvi hoje na rádio, e em tom de comédia, o que nasce torto, tarde ou nunca se endireita, e Afonso Henriques começou por bater na mãe...
A mudança, cada vez acredito mais, tem que vir de dentro para fora, só não sei o que ainda vai ser preciso acontecer para que essa alteração se dê.
..tantas palavras mal gastas..e estas?..serão necessárias?..haverá palavras necessárias?..
obrigado pela descoberta.
Já me posso gabar que li algo do senhor.
Até nutro alguma simpatia pela pessoa, mas ainda tem umbocadinho de rosa e o rosa não me fica bem...
Pois ESTE rosa fica-me mesmo bem!
Enviar um comentário